Poeta
Álvaro
Alves
de Faria

Canal do poeta

Livro do Amor

PAIXÃO

Denise Emmer

E foi quando Álvaro me convidou para escrevermos um livro de poemas juntos. Já trocávamos e-mails há tempos e nos conhecíamos de eventos literários em São Paulo, mas um livro a quatro mãos seria uma proposta de união poética. Haveria, então, de mudar o rumo das correspondências e transformá-las em poesia.

Dessa forma, iniciamos nossa jornada sem imaginarmos as portas do novo caminho que haveríamos de abrir. Das marés revoltas que nos esperavam. Das ventanias que desalinhariam nossos longos cabelos, até embaraçá-los em um nó cego.

A princípio, palavras de solidão e de uma tristeza perdida. Mas no quarto poema, eu o chamei de olhos de meia-noite no que ele me respondeu : meus olhos de meia-noite/ te procuram/ mesmo no tempo pretérito/ em que dizes viver/ e que eu vivo também. (…) Tenho tuas mãos vermelhas/ em minha pele/ e me vejo/ no espelho do teu rosto.

Assim, passamos a nos buscar em versos de silêncio e medo para dizer-nos cartas de amor não desveladas.

E enquanto ele inventava a Primavera, ao sonhar uma noite em meu corpo, eu chegava sem avisos em suas madrugadas, aproximando-me dele como um pássaro que pousa na tristeza.

De noite em noite. De lua em lua trocávamos poemas apressados. E, por um tempo, o mundo pareceu desaparecer como se não houvesse morte.

Ao longo dos 42 poemas de O secreto silêncio do amor, inventamos um tempo outro, onde o amor seria silenciosamente secreto e longínquo.

Eu, uma mulher de pássaros nas saias. Ele, um poeta antigo do século 18 ou um camponês a colher figos.

Hoje, esse livro de amor há de ocupar um lugar que se encontra vazio, mas a história que ele narra, é contada há séculos.

Enquanto houver vida, natureza, música, palavra, pios de pássaros. Paixão.

Rio, 15/03/2021

Lisboa

Alexandra Vieira de Almeida*

Em tempos em que o amor se tornou a imagem da banalidade e volubilidade, cantá-lo, em sua máxima expressão e nobreza, faz dessa obra poética magistral dos poetas Álvaro Alves de Faria e Denise Emmer algo incomum e que ultrapassa a barreira dos tempos. A epígrafe de Vinicius de Moraes já nos introduz, numa primeira leitura, à musicalidade, que tem um papel importantíssimo na condução dos ritmos e impulsos do amor, produzindo as oscilações e os movimentos dos estados de alma do amante e da amada. O livro tem 42 poemas, sendo 21 de Álvaro e 21 de Denise, perfazendo uma simetria perfeita no diálogo por meio de poemas endereçados um ao outro, como numa história narrada em versos, que, gradativamente, esse amor sublime e, ao mesmo tempo, carnal, no seu território imaginado, vai se tecendo a partir de metáforas originais e diferenciadas.

Nas cantigas medievais, se utilizava o recurso estilístico do leixa-pren, com a repetição dos segundos versos de um par de estrofes nos primeiros versos do par seguinte. Álvaro e Denise não usam esse recurso, mas, de forma ímpar e atípica, utilizam o discurso amoroso, de forma mais livre e imaginativa, retomando o discurso do outro, como novo desafio. Não se referem a outras formas de fazer poesia ligadas à tradição amorosa, como do Trovadorismo, do Romantismo, entre outras. Elegem, porém, o rigor formal próprio, com rimas e estruturação sonora mais autoral. Há um jogo de emissão e resposta, em que ambos são emissores e destinatários. Os poemas, tanto de Álvaro quanto Denise, estão num mesmo nível de interlocução, riqueza e beleza. Esse processo se dá por meio de uma linguagem implícita e carregada de uma realidade simbólica.

O secreto silêncio do amor é um livro excepcional em suas camadas múltiplas e profundas, de rara beleza, em que há o encontro de dois oceanos em sua dimensão imaginada. Há uma passagem no poema de Álvaro que nos faz lembrar de um poema de Castro Alves, na imagem das folhas e de um amor inatingível e eterno (“Adormecida”). No poema 42 de Denise, fechando com intensa beleza estética o livro, ela se refere à despedida do amado, de forma a lembrar o par romântico Romeu e Julieta, sem explicitar, como na cena clássica do balcão. Mas, tal obra em duas mãos, por ora aqui analisada, tem seus traços distintivos com relação a outros poemários, obras literárias e técnicas de estruturação literária. Escreve Denise em seus versos derradeiros: “A claridade é só um par de anjos que fugiram/Volte a dormir e abraçar-me enquanto existo//Não me deixes assim agora que chegastes/Não me digas o adeus que as ondas dizem aos mares//Pode ser tarde, tão tarde que não mais me vejas/Mesmo que me busque nas paixões — nossa tristeza”.

Os recursos simbólicos e estilísticos são vários e de uma originalidade rara em poesia. Há um jogo de palavras feito por Álvaro (poema 15) retomado por Denise (poema 16): “Vagarosa/mente” e “Se a jura mente/vagarosa”. Aqui, temos a dimensão do tempo para o amor acontecer, que, geralmente, percebemos, através das interpretações de Eros, não precisaria de pressa, mas que, se não for bem administrado, pode levar ao fator ilusório do sentimento. No entanto, anteriormente, no poema 12, Denise lança-nos uma visão contrastante, pois quer que o tempo passe mais rápido, para que ela se vista do amante em noite escura. A expectativa das horas longínquas e subterrâneas precisa ser subvertida pelo desejo erótico:

“Confesso eu procuro a noite
quando ainda arde o dia
puxo as estrelas ocultas
antes da hora prevista
se a claridade insiste
em ser nascente, eu faço
escurecer as cortinas
para que chegues mais cedo
e batas à minha porta
em toques de raros segredos
e beijos sonhados, harpias
em tesouros não achados
a poesia não nos basta
inventemos outros pactos
nos rastros de tua lágrima
quando te vestes de mim
a te percorrer o corpo
enquanto esperas me ver
aparecer-te num susto
a entrar pelas paredes”

Logo no início dessa belíssima história de amor versificada, o homem tem de acordar a mulher, como no amor cortês, suave e sutilmente, sem deixar de lado o forte erotismo, velado por imagens e símbolos como, por exemplo, o jogo entre o masculino (crisântemo) e o feminino (jasmim). O crisântemo, do grego “flor do ouro”, é maior, semelhante ao sol, e o jasmim, símbolo do amor eterno, da beleza e sensualidade, é pequeno, delicado, usado em arranjos matrimoniais e, geralmente, tem pétalas brancas.

Nesse casamento alquímico perfeito em seu puro êxtase e encaixe, encontramos os sonhos que Eros conduz. No primeiro poema, de Álvaro, há um rico aproveitamento semântico e estrutural da palavra “dor”, que se desdobra do substantivo para o verbo: “Uma dor assim profunda/dessas que doem/no fundo da noite,/como nos poetas românticos do século 18/que deixavam a vida/em qualquer lugar”. No mesmo poema, tem-se uma mistura extática entre fogo e água, pois tal “dor” queima como a chama e corta com a delicadeza das águas, que trazem, no entanto, a figuração do ímpeto de um rio indomesticável como o amor. A dor, distante e ausente, se dobra em adjetivos que, gradativamente, elevam a pulsão de vida e de morte, sendo “profunda”, “´plena”, “longa”, ou seja, tem-se o enaltecimento pela linguagem dessa dor, que é intrínseca aos amores mais densos e abissais.

Na resposta ao primeiro poema, Denise retoma essa dor a partir da metáfora da “noite escura”, em sua espera e expectativa. Há o contraste entre o “dormir” e o “acordar”, em que o homem deverá “despertar” o sono da mulher em meio à “escuridão”. Assim, a figura masculina acordará sua amada para o desabrochar do amor infinito como o oceano do delírio. Mas, paradoxalmente, é a amada, em sua posição, ao mesmo tempo de receptividade e atividade, que solicitará essa atitude do amante, numa simbiose em que os opostos se atraem como um ímã de encantamento mútuo e comunicativo. Há uma consonância de vozes, uma harmonia de seres que também apresentam suas diferenças de linguagem e vocabulário, sem, entretanto, deixar de criar pares de encontros linguísticos, como a língua amorosa da literariedade. Se a amada desperta, o amante também procura “despertar”, como podemos ver no poema 3, mostrando que o homem também precisa da ação da mulher, numa conjugação erótica lapidar, em que um não se sobressai ao outro, para que não haja hierarquia e o domínio domesticável dos corpos, em sua sublimidade sonhada e não realizada.

Os sujeitos líricos, ao longo do poema narrado, adquirem várias personas. Álvaro pode ser um poeta, um monge, um camponês, um pirata:

“Sonho com folhas íntimas
a percorrer teu corpo devagar
como o bater de um sino,
a sentir tua saliva na boca
a molhar-me o rosto,
mas as mãos estão frias
e nem chegou o Inverno,
assim te invento e te busco
para me concluir dentro de ti.
Não tenho cura
e já desisti de viver,
um poeta que procura sandálias
para caminhar cajados invisíveis,
monge de mim mesmo
que faz da poesia
uma prece de silêncio,
mas é tarde demais.”

Denise também pode ser uma poeta, uma infanta suicida, uma bailarina, uma musicista e assim por diante:

“Meu violoncelo pintado de sangue,
aquele das infantas suicidas,
navegará conosco à nossa ilha
que não existe ainda e nem respira.”

A obra contém um amor sublime e sutil. Erótico, sem ser agressivo ou explícito. O trabalho com os verbos é bem elaborado, nos levando a uma poesia de procura de uma ação, de um estado, de um acontecimento, quando, na verdade, nada acontece. Temos um livro com preciosas figuras de linguagem, inversões, rimas externas e internas, aliterações, assonâncias, num universo de linguagem inventiva. A poesia e o amor se abraçam dolorosamente numa mesma chaga. E é pela tessitura da linguagem que se constrói essa obra admirável com o uso de signos linguísticos, mesclando a palavra e o silêncio, os vazios que os textos e as palavras escondem para serem desvendados pelos leitores perspicazes e sensíveis aos véus que ocultam os significados mais oceânicos. Os versos de O secreto silêncio do amor são de uma beleza indescritível. O trabalho poético com os contrastes é fascinante, revelando a face ambígua do amor, entre o sagrado e o profano, o prazer imaginado e a dor da ausência e da distância, o transcendente em sua eternidade e o carnal desejado, o abstrato e o concreto, tudo, num jogo rítmico perfeito com rimas variadas e originais, em que o amor se desdobra nos fios de uma lã rara que percorrem os poemas.

O “espelho”, metáfora das semelhanças entre o amante e a amada, se reflete nas estações do ano, nas quais eles se encontram nos signos da natureza e dos objetos que imantam a energia dos seres amorosos como na Pedra de Bolonha. Em transbordamento afetivo, o amor traz, em seu encalço, a língua ferida do amor. Escreve Denise: “O frasco de perfume,/saiba,/é verso de madrugada/que acende a alvorada/quando me vejo em ti/espelhada”. A obra é envolvente, vai nos enlaçando com seu magnetismo lírico e imagético, nos fazendo ter a ânsia de querer desfolhar cada vez mais os enigmas e segredos traçados em versos de um amor imensurável, mas que toca a materialidade da vida a partir do desejo. A poesia é narrada e cantada num duplo jogo entre prosa e poesia. Há uma mistura entre o sagrado e o profano como muitos poetas cantaram, no entanto, aqui, os poetas carregam uma dicção particular sem se prenderem muito à tradição, trazendo uma visão original do amor em seu aspecto de incandescência e tremor. Se, no Cântico dos Cânticos da Bíblia, temos metáforas amorosas com a presença muito forte da natureza, em Álvaro e Denise, encontramos um amor que os faz desconhecer em razão do mistério, pois o amor vem antes da palavra, que, para os dois, é “pouca”. Diz Álvaro:

“É tudo muito pouco,
é tudo muito pouco,
é tudo muito pouco
quando o poema não diz,
e na pele escorre
essa chuva que não vemos
e nos molha os pés,
mas não percebemos
essa lágrima branca
que risca o rosto
e escreve a frase
que nos necessita e faz viver,
o que nunca compreendemos.”

A poesia ainda é pouca para o amor caber nela. Está em seu silêncio mais oculto. O título do livro ficou bem sugestivo, indicando o segredo do amor em sua intimidade que deve permanecer no silêncio entre dois seres que se completam. Não é compartilhado a mil vozes. Ele revela muito sofrimento. É uma poesia dolorida, marcada pelo desalento, como Denise diz, num dos poemas iniciais. A ausência precisa, apesar de tudo, ser relatada em forma de mensagens entre os seres amorosos para que o amor se expanda como num mar, com suas ondas de partidas e retornos.

As imagens poéticas utilizadas por Álvaro e Denise são de uma transcendência rara que toca o céu estrelado. Sublime dicção, que desvela a sacralidade do amor. O silêncio desse sentimento mor se mostra por meio de uma poética expressiva, com uma linguagem calada pela dor em seu deserto de emoções e pensamentos. Denise explana:

“tu me abraçaste eu me lembro não foi sonho
foi um acontecimento natural
do espaço
agora estou a pensar se foi o espaço a me enganar
ou se fostes tu a voar
para os desertos”

Os versos reverberam as flechadas de Eros, o deus que aponta as setas para que o amor floresça, mas que traz, na ponta da seta, a dor que corta e sangra o corpo, se desdobrando na alma. O jogo entre luz e sombra, o dia e a noite, a pedra e o perfume, revela os momentos de êxtase e sofrimento desse amor. Eros é um desejo que apresenta o sussurro, o murmurar de coisas inexplicáveis, secretas, que as palavras não podem descrever, em sua totalidade, pois a poesia é insuficiente para conter um amor incontornável. Mas os versos são uma tentativa de captar o silêncio do amor em suas páginas brancas, em que a ausência e a presença se afirmam. Os poemas dizem por si, por sua intimidade arrebatadora. O diálogo se dá a partir dos nomes reais dos poetas sem os sobrenomes, Álvaro e Denise. Isso cria um elo afetivo mais intenso e não apela para a racionalização do amor. Esse amor cria uma ponte inventiva entre linguagem e sagrado. Cria-se um paradoxo muito criativo com o título da obra, porque é pela palavra poética, com suas metáforas inusitadas, que se vela e desvela essa intimidade entre o amante e sua amada. Palavras como “meia-noite”, “alvorada”, “monge”, entre outras, despertam a rede sígnica da repetição e da diferença. As imagens não se movem em círculos, mas em espiral, pois, entre o emissor e a receptora, ou a emissora e o destinatário, há palavras que se desdobram em suas analogias, pertencimentos, ao mesmo tempo, revelando as diferenças e marcas próprias de cada escrita, Álvaro e Denise, em face do encontro.

Encontramos também em O secreto silêncio do amor a alternância entre formas e estilos, demonstrando uma variedade estilística. Há poemas maiores e outros mais concisos. Utilizam versos longos e, em outros, trechos mais curtos. Isso revela os movimentos ondulatórios das almas em seus estados amorosos, com a polifonia de vozes que se misturam e se separam, numa dança erótica oracular e bem acabada, com arroubos líricos dos sujeitos em plena comunhão sonhada de uma chama viva e dilacerante, que anima e queima. O tema da queda do Paraíso, na sua referência bíblica, também comparece aqui, com requintes poéticos de extrema profusão de Eros, perfazendo o caminho sacro-profano dos mitos. Álvaro diz:

“Deste-me
tua palavra quieta,
teu corpo trêmulo,
teu gozo longo.
Deste-me a maçã
do teu amor
mais veemente,
a mim,
teu homem,
tua serpente.”

E Denise responde, com todo o seu desejo pelo objeto amado, fundindo o corpóreo e o incorpóreo num só movimento, em que a matéria e o espírito se unem pela palavra que tem as asas de Eros e o fogo ardente prometeico que revela o corpo do amante:

“a barba por fazer
os cabelos derretidos,
eu já sabia do amor
que iria viver contigo.
Foi numa noite,
daquelas que se perdem
sem que possamos
conter os animais,
que eu te entreguei
meu corpo
e meus ais
enquanto o céu
se desprendia
do espaço,
no teu cansaço agudo
a me sonhar”.

A antevisão material do amante pela amada cria esse jogo rico entre a imaginação, cuja metáfora é o “céu”, em seu aspecto aéreo, e a entrega dos corpos, como espaço da ausência que se quer presente, pelo dom de enigmar pelos versos metafóricos que procuram pela afirmação do ato. Apesar da profusão de verbos, pelo desejo da ação e do ato erótico, o sonho se desprende da realidade enquanto potência de tudo abarcar. E é pela falta, pelo vazio, pelo nada, criado pelo espanto desse amor inacabado, que o desejo não se completa em sua totalidade, permanecendo na sua própria esfera do querer sem ter. Ou do ser sem estar.

Portanto, Álvaro e Denise trazem, com esse livro primoroso, uma voz autoral digna dos grandes mestres da literatura sobre o tema do Amor. Sem excessos, mas com a lapidação dos que sabem de seu ato de escrita, os dois poetas carregam, num mar de Eros, um barco de silêncios e interditos, que procura o reino das possibilidades infinitas. Com precisão, rigor, exatidão e técnica, esse aspecto estrutural não deixa de lado a densidade lírica universal que é tratada com singularidade por dois nomes premiados e consagrados da nossa literatura brasileira, equiparando-se aos relevantes nomes da lírica internacional com esmero e prazer, reflexão e erotismo, unindo dois mundos semelhantes e dessemelhantes em sua assonância e equilíbrio, inaugurando novas ilhas de ritmos, pausas, música e mudez.

*Escritora e Doutora em Literatura Comparada (UERJ)

ÁLVARO E DENISE, O SECRETO SILÊNCIO DO AMOR

Thereza Christina Rocque da Motta

Poesia é diálogo. Pelo menos, os poemas são partes de um diálogo, uma fala que dirigimos a alguém que ainda não nos respondeu. Talvez nunca haja resposta. Mas, ao escrever um poema, ensaiamos o que queremos dizer, o que queremos expressar, o que ficou para ser dito depois, e que não teve chance de ser dito ao vivo.

Aqui Álvaro e Denise fazem aquilo para que a poesia foi feita.

Uniram suas falas e criaram um diálogo poético que nem sempre acontece. Nem sempre um poema alcança uma resposta. Nem sempre fazemos com que o poema chegue à pessoa a quem ele se destina. Nem sempre quem recebe o poema pode ou sabe respondê-lo. Mas esses dois poetas, sim. E alcançar o outro poeta a quem os poemas se destinam faz deste livro um exercício necessário para quem ler estes poemas.

Eu já pressentia, quando Álvaro e Denise me pediram para prefaciar este livro, o que viria. Dois grandes poetas, cada um em sua órbita, que possuem um dom único de dizer o que normalmente é deixado para lá. Nem sempre podemos nos dedicar à fala e a escrever o que sentimos. E o Amor é um dos sentimentos mais desprezados, porque ninguém confia nos amantes. Estão cegos, iludidos, imersos em seu sentimento absoluto e, ao mesmo tempo, parecem tão tolos por causa do amor que os toma. Mas, não. Não é da tolice do amor de que estamos falando e, sim, da transformação que o amor provoca em cada um.

Cada um se expressa ao extremo de sua voz, para dizer o que o outro ainda não ouviu. E, ao ouvi-lo, volta-se para este apaixonado e lhe responde. Como perdemos tempo em não dizer o que sentimos. Como é útil, até para quem não está apaixonado, dar-se conta de que o amor existe para nos lembrarmos dele.

No início, nos despojamos. Damos tudo o que temos ao amor. Depois, escolhemos as palavras para dizer exatamente o que é preciso ser dito: “Meus olhos da meia-noite/ te procuram/ mesmo no tempo pretérito/ em que dizes viver/ e que eu vivo também” (Álvaro, 5).

Todos os gestos, olhares, mãos, braços, pernas e corações se sincronizam quando amamos. Um parece adivinhar o que o outro sente, vivendo no mesmo “tempo pretérito” em que ambos se inserem.

O amor inaugura um tempo novo. Um tempo onde não há mais ninguém que caminhe com eles. Um tempo em que só há dois, e o diálogo acontece justamente porque só eles podem falar e ouvir: “Tenho tuas unhas vermelhas/ em minha pele/ e me vejo/ no espelho de teu rosto,/ como se não fosse eu,/ que não conheço mais” (Álvaro, 5).

O Amor traz o esquecimento de si, quando tudo o que importa é o outro, e nos vemos nele, como ele se vê em nós: “Então, se me procuras,/ teus olhos são de segredo,/ estou aqui/ a buscar-me em palavras/ de silêncio e medo/ para dizer-te uma carta de amor/ nunca desvelada”. (…) “O frasco de perfume,/ saiba,/ é verso de madrugada/ que acende a alvorada/ quando me vejo em ti/ espelhada” (Denise, 6).

A recorrência do espelho (eu me vejo em ti/tu te vês em mim) é o espelhamento de mim em você, de você em mim. Somos um, dividido em duas partes e, como dois, sentimos e fazemos o que um sente e faz. Embora dotado de identidade, o Eu busca o que o outro é por se ver igual a ele. O que eu sou nada mais é do que és.

Quando escrevi minha peça Breve anunciação (Ibis Libris, 2013) a partir de poemas escritos em sequência, descobri esse diálogo interno, em que um poema respondia ao anterior em sincronia.

Aqui, Álvaro e Denise se justapõem para um responder ao outro, numa troca de cartas amorosas, construindo um Amor, que, por si só, está inteiro e dividido em duas partes. O que um diz complementa o que o outro responde e, assim, sucedem-se as visões e os insights do próprio amor enunciado.

A cada poema, a cada resposta, avançam em progressão geométrica o que cada um quer dizer, o que cada um traz para o caldeirão do Amor ardente: “A ti também te busco/ nas palavras do teu silêncio” (Álvaro, 7).

O silêncio também é fala e é respondido. As metáforas se sucedem para explicar o indizível. Cada um se vê no vento, na aragem, no outono, na primavera, nas folhas das árvores, para captar a essência do sentimento.

Amar é reinventar-se. Não sei mais nada do que eu sabia, e descubro tudo pela primeira vez. Como se, no Amor, só existisse o novo: “Nos versos dos meus acenos/ te redescobres, te inventas/ nos teus, eu também acordo/ as noites e suas lendas”. (…) “quando te vejo em segredo/ vem o dia, não te esqueço/ e é teu meu pensamento” (Denise, 10).

Cessa o tempo dos relógios, cessa o calendário, e as manhãs servem apenas para que o sol nasça, e as noites sejam a antemanhã da próxima aurora. Os dias não avançam, senão para se buscar infinitamente: “Confesso, eu procuro a noite/ quando ainda arde o dia/ puxo as estrelas ocultas/ antes da hora prevista/ se a claridade insiste/ em ser nascente, eu faço/ escurecer as cortinas/ para que chegues mais cedo” (Denise, 12).

“Para que chegues mais cedo”: é isso o que o Amor exige – Presença. A presença que as cartas, as palavras e os poemas só anunciam. A presença, em si mesma, é a exigência máxima da Poesia.

A Poesia existe para que o amor se faça presente, pois, ao imaginar o amado, é como se ele estivesse ali: “Ao ser em mim meu próprio desejo/ percorres minhas ruas desertas/ por onde ando entardeceres/ na falta de caminhos mais distantes.// Teu abraço é a minha casa que me abriga/ como habitar teu corpo em silêncio/ as palavras estão ausentes/ e as bocas se calam na face,/ essa que tenho ainda,/ que é meu único disfarce” (Álvaro, 13).

Um silêncio responde a outro silêncio. As duas falas se perfuram de ausência. Eu estou aqui, onde tu também estás. Eu te ouço, mesmo quando não me falas. O que é um ser sem seu correspondente amor, que há de ouvir e dizer o que quer que seja dito?

“Escreverei um poema de silêncios/ para que ouças em mim uma tristeza/ calada, como essa que abriga/ nossos abraços sombrios e ausentes” (Denise, 14). “Como no amor/ a poesia é pouca” (Álvaro, 15).

Por mais que falem, parecerá pouco. Por isso as cartas se estendem. E por isso o universo é infinito. É a sede que temos de infinito. O tempo é pouco por buscarmos o infinito.

Álvaro Alves de Faria e Denise Emmer conseguem, em 42 poemas, urdir a infinitude contida no Amor, com todas as palavras que eles escolheram para dizê-la. O ápice do Amor é a permanência em forma de palavras e silêncios: “Todo poema necessita de amor e medo” (Álvaro, 17).

Por mais que se busque o que está além do abraço, o que está contido no coração que amo e que me ama, queremos o indizível, que não pode ser transposto em versos. E, mesmo assim, insistimos em dizê-lo, porque, em algum momento, havemos de alcançar a palavra: “Que possa então o amor viver contigo,/ com teu anjo do céu em mim antigo,/ o que te sinto em sonho o meu destino” (Álvaro, 19). “E o amor que hei de viver contigo/ será o mais antigo” (Denise, 20).

No Amor, não há distâncias, não há diferenças. Na Poesia, há somente o Presente, o presente em que amo e sou amado da mesma forma, em que corpo e mente se fundem, todo o universo gira para um único fim – que eles se encontrem, mesmo depois de muito tempo: “Sou um poeta antigo,/ daqueles que vivem,/ no século 18,/ que não existem mais/ e veem a poesia como uma chaga” (Álvaro, 25). “Se para ti a poesia é chaga/ para mim é sofrimento que não quis” (…) “será preciso uma vez morrer de dor”. (…) “quero-te ao meu lado e o que desejo/ sabes nos poemas que te escrevo.// Ou que escreverei ainda/ sob a luz das tristes lamparinas/ mesmo que a poesia não importe/ mesmo que a poesia não exista” (Denise, 26).

Só se escreve em extremo. Só em extremo enxergamos o que normalmente não vemos. O dia não possui luz suficiente para os sábios. E os que são sábios por meio da poesia, somente eles enxergarão. E, mesmo vendo, pensarão não bastar para atingir o Amor: “Não saberei como te amar,/ porque não tenho o silêncio das pombas”. (…) “Não saberei das canções medievais/ que me habitam,” (…) “porque o amor se quebra como uma xícara” (Álvaro, 31).

E, mesmo negando-a, negando-se, o Amor se instala em cada nervo equidistante, em que as palavras se perfilam trazendo ventos de longe: “Porque te busco em sombrios/ se és o brilho que acende/ e me desperta e me leva/ com teus versos de navios// que hei de embarcar um dia,/ contigo, mares infindos” (Denise, 32).

Amor é espera. É presença. É ausência. É ser com e sem o outro. Ser indivisível, embora a outra parte esteja longe. Ser e pertencer é o mesmo que ter e perder, pois, embora estejam juntos, poderão partir: “Eu sei de ti e do teu corpo em mim/ e te abrigo com o casaco que deixaste/ na noite, para me acolher” (Denise, 36). “Dá-me as palavras que me faltam/ para te dizer melhor/ quando nada é preciso,/ senão sentir até o fim/ em que tudo se revela/ e tudo está por descobrir” (Álvaro, 37).

O Amor adormece como tudo que é intenso. Não vive ao relento, a céu aberto. Não vive só. Por isso, é preciso ser despertado, para que volte: “A paixão não é matéria, é fantasma/ que atrai a incerteza e fenece/ na razão direta da tristeza” (Denise, 40).

Se há alegria, há tristeza – não vivemos um mar de rosas que nunca murcham. A própria rosa deve renascer como outra. A permanência tem seu lado efêmero. Algo deve fenecer para que ressurja, radiante. Amor, paixão, tristeza, alegria e dor vivem em uma mistura heterogênea de expectativas. Nada é sem que volte a ser, e não deixe de ser porque passou.

Sempre nos perguntamos sobre o depois. Depois do Amor, o que haverá? Depois da vida, há outra vida? A Poesia tem o condão de guardar o tempo. O tempo do Amor permanece nos poemas, como em um frasco de perfume. Ele continua a existir quando lemos as palavras: “Depois talvez o canto e o poema,/ talvez o dia, talvez a luz,/ o talvez que se guarda na bolsa de anoiteceres,/ talvez um sino nostálgico,/ as horas longínquas, que o amor tem sempre a hora para existir” (Álvaro, 41). “Porque assim é o amor quando ele vem das asas/ de um mensageiro além, munido de viagens// onde colocaremos nossos pés e corpos na alegria/ quando as noites e os dias são um só encontro” (Denise, 42).

Aos dois poetas, Álvaro e Denise, só posso agradecer as palavras que escreveram e as que me fizeram escrever para eles.

Como todo amor,

Rio de Janeiro, 5 de novembro de 2020

Nota: Esta é a quinta vez que Álvaro Alves de Faria escreve em parceria com uma mulher. Faz parte de um projeto que ele criou em que quer mostrar que a mulher escreve poesia melhor que o homem, por ser mais observadora, mais sensitiva e delicada. Já escreveu com quatro outras escritoras: o primeiro, com a paulistana Thereza Christina Rocque da Motta (Rio de Janeiro), o segundo, com a espanhola Montserrat Villar González (Salamanca), o terceiro, com a portuguesa Leocádia Regalo (Coimbra) e o quarto com a italiana Stefania Di Leo (Nápoles). Neste quinto, com a carioca Denise Emmer, ambos produziram estes poemas epistolares sobre o amor.

Livro recupera plenitude do Amor em tempos de aridez

Na obra, o Amor é visto de forma ímpar e singular pelos autores que tecem em seus versos os acordes do desejo

POR VICTOR YEMBA

Mostrar que o amor é capaz de vencer mesmo em tempos áridos que secam as lágrimas da sensibilidade. É com essa temática que os poetas consagrados Álvaro Alves de Faria e Denise Emmer lançam seu mais novo livro de poesias “O secreto silêncio do amor” (Editora Penalux, 2021).

Na obra, o Amor é visto de forma ímpar e singular pelos autores que tecem em seus versos os acordes do desejo. Em 42 poemas bem cantados e narrados, eles apresentam o poder das flechadas de Eros que dilaceram as almas e os dois seres que se correspondem por meio de cartas. Por meio do lirismo, os poetas apresentam o desejo como a busca do encontro, do enlaçamento de duas vidas que se tocam pelo labirinto da poeticidade.

O prefácio é assinado pela escritora, tradutora e editora Thereza Christina Rocque da Motta, que analisa a obra pela ótica das cartas trocadas entre emissor e destinatária, citando trechos para a compreensão da comunicação entre dois seres tocados pelo Amor. A obra mostra também que o Amor tem seus reveses, o lado paradoxal, que reúne, na imagem poética, o sonho e o dilaceramento da carne e do espírito.

Álvaro, por exemplo, em alguns versos, nos traz a dimensão desconhecida e misteriosa desse sentimento, que nos ataca sutilmente, como mostra nos versos: “então estar dentro de ti para te sentir mais,/tão mais que não saiba o caminho de volta,/assim tão mais e tão profundamente/a me sentir ser parte do teu corpo”.

Já Denise reafirma, com sua voz própria, o silêncio e a linguagem calada desse sentimento mor. O livro ainda mostra as falas originárias e diferenciadas do homem e da mulher, que se tangenciam pela potência de Eros em aproximar as mentes e os corpos do amante e da amada, como apresenta nos versos: “Ao teu lado sou uma mulher com pássaros nas saias/Ao caminharmos num parque onde serás a noite//E eu a madrugada desnuda que se abre/Em algum leito longínquo e estrelado”.

Livro recupera a plenitude do Amor em tempos de aridez

Por Equipe Times Brasília

Mostrar que o amor é capaz de vencer mesmo em tempos áridos que secam as lágrimas da sensibilidade. É com essa temática que os poetas consagrados Álvaro Alves de Faria e Denise Emmer lançam seu mais novo livro de poesias “O secreto silêncio do amor” (Editora Penalux, 2021).

Na obra, o Amor é visto de forma ímpar e singular pelos autores que tecem em seus versos os acordes do desejo. Em 42 poemas bem cantados e narrados, eles apresentam o poder das flechadas de Eros que dilaceram as almas e os dois seres que se correspondem por meio de cartas. Por meio do lirismo, os poetas apresentam o desejo como a busca do encontro, do enlaçamento de duas vidas que se tocam pelo labirinto da poeticidade.

O prefácio é assinado pela escritora, tradutora e editora Thereza Christina Rocque da Motta, que analisa a obra pela ótica das cartas trocadas entre emissor e destinatária, citando trechos para a compreensão da comunicação entre dois seres tocados pelo Amor. A obra mostra também que o Amor tem seus reveses, o lado paradoxal, que reúne, na imagem poética, o sonho e o dilaceramento da carne e do espírito.

Álvaro, por exemplo, em alguns versos, nos traz a dimensão desconhecida e misteriosa desse sentimento, que nos ataca sutilmente, como mostra nos versos: “então estar dentro de ti para te sentir mais,/tão mais que não saiba o caminho de volta,/assim tão mais e tão profundamente/a me sentir ser parte do teu corpo”.

Já Denise reafirma, com sua voz própria, o silêncio e a linguagem calada desse sentimento mor. O livro ainda mostra as falas originárias e diferenciadas do homem e da mulher, que se tangenciam pela potência de Eros em aproximar as mentes e os corpos do amante e da amada, como apresenta nos versos: “Ao teu lado sou uma mulher com pássaros nas saias/Ao caminharmos num parque onde serás a noite//E eu a madrugada desnuda que se abre/Em algum leito longínquo e estrelado”.

Sobre os autores:

Poeta e musicista, Denise Emmer conquistou os prêmios ABL de Poesia (2009); José Marti UNESCO, pelo conjunto da obra; APCA de poesia; Olavo Bilac (ABL); PEN Club do Brasil de poesia e de romance; entre outros. Publicou vinte e um livros, dos quais dezessete são de poesia, três romances e um de contos. Participou de relevantes antologias da poesia brasileira, tais como 41 poetas do Rio (Minc), Antologia da Nova Poesia Brasileira (Ed. Hipocampo), Poesia Sempre (Fundação Biblioteca Nacional), Ponte poética Rio–São Paulo (Ed. 7letras), bem como das Revistas Califórnia College of the at Eleven Eleven (EUA), Newspaper Surreal Poets, (EUA) e Revista da Poesia, Metin Cengiz (Turquia), Revista Crear in Salamanca (Espanha), traduzida pelo Alfredo Pérez Alencart.

Jornalista, poeta, autor de teatro e escritor, Álvaro Alves de Faria conquistou os prêmios Poesia e Liberdade Alceu Amoroso Lima (RJ, 2018), pelo conjunto da obra; Prêmio Poesia Guilherme de Almeida (2019, SP), pelo conjunto da obra, Prêmio Jabuti (1976 e 1983) como crítico literário e por sua atuação em favor do livro no jornalismo cultural e ainda, pelo mesmo motivo, três vezes o APCA ESPECIAL (1981, 1988 e 1989). Tem mais de 60 livros publicados no Brasil, incluindo romances e ensaios literários, além de 22 livros publicados em Portugal, oito na Espanha e um na Itália. Foi o iniciador, nos anos de 1960, do movimento de recitais públicos de poesia em São Paulo. Realizou nove recitais no local e foi detido cinco vezes pelo Dops, acusado de subversão.

GÊNERO: poesias | FORMATO: 14X21 | ANO: 2021 | PÁGINAS: 86| Pólen soft 80G | Valor: R$ 38,00

O Poder de Amar

Livro mostra que o amor supera tempos sombrios

Com 42 poemas e editado pela Penalux, obra tem como temática mostrar que o amor é capaz de vencer, mesmo em tempos áridos

“O secreto silêncio do amor”, de Álvaro Alves de Faria e Denise Emmer, apresenta o poder das flechadas de Eros que dilaceram as almas e os dois seres que se correspondem por meio de cartas

Não poderia deixar de agradecer essa oportunidade de divulgar os talentos literários.
Este mês completo oito anos de colaboração aqui no portal…

Mostrar que o amor é capaz de vencer, mesmo em tempos áridos que secam as lágrimas da sensibilidade. É com essa temática que os poetas Álvaro Alves de Faria e Denise Emmer lançam seu mais recente livro de poesias, “O secreto silêncio do amor” (Editora Penalux, 2021).

Na obra, o amor é visto de forma ímpar e singular pelos autores que tecem em seus versos os acordes do desejo. Em 42 poemas bem cantados e narrados, eles apresentam o poder das flechadas de Eros que dilaceram as almas e os dois seres que se correspondem por meio de cartas. Por meio do lirismo, os poetas apresentam o desejo como a busca do encontro, do enlaçamento de duas vidas que se tocam pelo labirinto da poeticidade.

O prefácio é assinado pela escritora, tradutora e editora Thereza Christina Rocque da Motta, que analisa a obra pela ótica das cartas trocadas entre emissor e destinatária, citando trechos para a compreensão da comunicação entre dois seres tocados pelo amor. A obra mostra também que o amor tem seus reveses, o lado paradoxal, que reúne, na imagem poética, o sonho e o dilaceramento da carne e do espírito.

Álvaro Alves, por exemplo, em alguns versos, nos traz a dimensão desconhecida e misteriosa desse sentimento, que nos ataca sutilmente: “então estar dentro de ti para te sentir mais,/tão mais que não saiba o caminho de volta,/assim tão mais e tão profundamente/a me sentir ser parte do teu corpo”.

Já Denise reafirma, com sua voz própria, o silêncio e a linguagem calada desse sentimento mor. O livro ainda mostra as falas originárias e diferenciadas do homem e da mulher, que se tangenciam pela potência de Erro sem aproximar as mentes e os corpos do amante e da amada, como apresenta nos versos: “Ao teu lado sou uma mulher com pássaros nas saias/Ao caminharmos num parque onde serás a noite//E eu a madrugada desnuda que se abre/Em algum leito longínquo e estrelado”.

Quem são os autores

Denise Emmer – Poeta e musicista, conquistou os prêmios ABL de Poesia (2009); José Marti Unesco, pelo conjunto da obra; APCA de poesia; Olavo Bilac (ABL); PEN Club do Brasil de poesia e de romance; entre outros. Publicou 21 e um livros, dos quais 17 são de poesia, três romances e um de contos. Participou de antologias da poesia brasileira, tais como “41 poetas do Rio” (Minc), “Antologia da Nova Poesia Brasileira” (Editora Hipocampo), “Poesia Sempre” (Fundação Biblioteca Nacional), “Pontepoética Rio-São Paulo” (Editora 7letras), bem como das revistas “Califórnia College of the at Eleven Eleven” (EUA), “News paper Surreal Poets”, (EUA) e “Revista da Poesia”, Metin Cengiz (Turquia), “Revista Crear in Salamanca” (Espanha), traduzida pelo Alfredo Pérez Alencart. Foi homenageada pela PoeArt Editora em 2018 no livro “Vozes de Aço XX”.

Álvaro Alves de Faria – Jornalista, poeta, autor de teatro e escritor, conquistou os prêmios Poesia e Liberdade Alceu Amoroso Lima (RJ, 2018), pelo conjunto da obra; Prêmio Poesia Guilherme de Almeida (2019, SP), pelo conjunto da obra, Prêmio Jabuti (1976 e 1983) como crítico literário e por sua atuação em favor do livro no jornalismo cultural e ainda, pelo mesmo motivo, três vezes o APCA Especial (1981, 1988 e 1989). Tem mais de 60 livros publicados no Brasil, incluindo romances e ensaios literários, além de 22 livros publicados em Portugal, oito na Espanha e um na Itália. Foi o iniciador, nos anos de 1960, do movimento de recitais públicos de poesia em São Paulo. Realizou nove recitais no local e foi detido cinco vezes pelo Dops, acusado de subversão. Foi homenageado pela PoeArt Editora em 2015 no livro “Vozes de Aço XVII”.

Livro recupera a plenitude do Amor em tempos de aridez

Mostrar que o amor é capaz de vencer mesmo em tempos áridos que secam as lágrimas da sensibilidade. É com essa temática que os poetas consagrados Álvaro Alves de Faria e Denise Emmer lançam seu mais novo livro de poesias “O secreto silêncio do amor” (Editora Penalux, 2021).

Na obra, o Amor é visto de forma ímpar e singular pelos autores que tecem em seus versos os acordes do desejo. Em 42 poemas bem cantados e narrados, eles apresentam o poder das flechadas de Eros que dilaceram as almas e os dois seres que se correspondem por meio de cartas. Por meio do lirismo, os poetas apresentam o desejo como a busca do encontro, do enlaçamento de duas vidas que se tocam pelo labirinto da poeticidade.

O prefácio é assinado pela escritora, tradutora e editora Thereza Christina Rocque da Motta, que analisa a obra pela ótica das cartas trocadas entre emissor e destinatária, citando trechos para a compreensão da comunicação entre dois seres tocados pelo Amor. A obra mostra também que o Amor tem seus reveses, o lado paradoxal, que reúne, na imagem poética, o sonho e o dilaceramento da carne e do espírito.

Álvaro, por exemplo, em alguns versos, nos traz a dimensão desconhecida e misteriosa desse sentimento, que nos ataca sutilmente, como mostra nos versos: “então estar dentro de ti para te sentir mais,/tão mais que não saiba o caminho de volta,/assim tão mais e tão profundamente/a me sentir ser parte do teu corpo”.

Já Denise reafirma, com sua voz própria, o silêncio e a linguagem calada desse sentimento mor. O livro ainda mostra as falas originárias e diferenciadas do homem e da mulher, que se tangenciam pela potência de Eros em aproximar as mentes e os corpos do amante e da amada, como apresenta nos versos: “Ao teu lado sou uma mulher com pássaros nas saias/Ao caminharmos num parque onde serás a noite//E eu a madrugada desnuda que se abre/Em algum leito longínquo e estrelado”.

Sobre os autores:

Poeta e musicista, Denise Emmer conquistou os prêmios ABL de Poesia (2009); José Marti UNESCO, pelo conjunto da obra; APCA de poesia; Olavo Bilac (ABL); PEN Club do Brasil de poesia e de romance; entre outros. Publicou vinte e um livros, dos quais dezessete são de poesia, três romances e um de contos. Participou de relevantes antologias da poesia brasileira, tais como 41 poetas do Rio (Minc), Antologia da Nova Poesia Brasileira (Ed. Hipocampo), Poesia Sempre (Fundação Biblioteca Nacional), Ponte poética Rio–São Paulo (Ed. 7letras), bem como das Revistas Califórnia College of the at Eleven Eleven (EUA), Newspaper Surreal Poets, (EUA) e Revista da Poesia, Metin Cengiz (Turquia), Revista Crear in Salamanca (Espanha), traduzida pelo Alfredo Pérez Alencart.

Jornalista, poeta, autor de teatro e escritor, Álvaro Alves de Faria conquistou os prêmios Poesia e Liberdade Alceu Amoroso Lima (RJ, 2018), pelo conjunto da obra; Prêmio Poesia Guilherme de Almeida (2019, SP), pelo conjunto da obra, Prêmio Jabuti (1976 e 1983) como crítico literário e por sua atuação em favor do livro no jornalismo cultural e ainda, pelo mesmo motivo, três vezes o APCA ESPECIAL (1981, 1988 e 1989). Tem mais de 60 livros publicados no Brasil, incluindo romances e ensaios literários, além de 22 livros publicados em Portugal, oito na Espanha e um na Itália. Foi o iniciador, nos anos de 1960, do movimento de recitais públicos de poesia em São Paulo. Realizou nove recitais no local e foi detido cinco vezes pelo Dops, acusado de subversão.

Tres poemas de Álvaro Alves de Faria y Dennise Emmer, traducidos al castellano

Denise Emmer y Álvaro Alves de Faria

Dejo conocer las traducciones que acabo de hacer de tres poemas de Álvaro Alves de Faria y de Denise Emmer, dos destacados autores brasileños. Forman parte de su reciente libro ”El secreto silencio del amor ” (Editorial Penalux, 2021), escrito al alimón por ambos: al primer texto de Alves de Faria, corresponde la respuesta de Emmer. Y así hasta el poema 42 (21 de cada poeta).

Ahora pueden leer, como un aperitivo, los tres primeros poemas de cada uno. Antes, unos datos básicos de los dos autores.

Álvaro Alves de Faria (São Paulo, 1942), una de las voces esenciales de su país, donde ha recibido dos Premio Jabuti (los más prestigiosos de Brasil) y tres premios de la APCA por su dedicación al libro en sus vertientes de periodismo cultural y crítica literaria. Como poeta, los más recientes premios a él otorgados son el “Premio de Poesía y Liberdad Alceu Amoroso Lima” (Río de Janeiro, 2018) y el “Premio Guilherme de Almeida de Poesía” (São Paulo, 2019). El poeta es autor de más de 50 libros en Brasil, especialmente en poesía. También es autor de obras de teatro y periodismo. Otros 21 libros los ha publicado en Portugal, además de los 8 aparecidos en España. Alves de Faria se considera un militante de la poesía desde los tiempos de El sermón del Viaducto, en los años 60, cuando realizó 9 recitales en el Viaducto do Chá, en São Paulo, con micrófono y cuatro altoparlantes. Por este motivo fue detenido cinco veces por la Policía. El Sermón del Viaducto acabó siendo prohibido. Hacia finales de los 70 la censura también prohibió su libro 4 Cantos de Pavor y Algunos Poemas Desesperados. En los años 80 su obra de teatro Sálvese quien pueda que el jardín se está incendiando, que recibiera el Premio Anchieta de Teatro, en su momento uno de los más importantes de Brasil, también fue prohibida de llevar a escena durante ocho años. En 1969 el poeta estuvo preso durante 11 meses como subversivo y por dibujar los carteles del entonces Partido Socialista Brasileño. Tres años después recibió un disparo en el oído, cuya bala todavía está alojada en su cabeza, como herencia de la dictadura militar brasileña. Fue homenajeado por el Encuentro de Poetas Iberoamericanos del año 2007, publicándose una antología suya titulada “Habitación de Olvidos”, por mí traducida.

Denise Emmer es poeta, compositora, cantante, violonchelista y narradora brasileña, nacida en Río de Janeiro el año 1958. Por sus obras poéticas ella ha recibido, entre otros, los siguientes premios: Premio Guararapes de Poesía (UBE,1987);Premio Unión Brasileña de Escritores (UBE, mejor autor joven, 1988); Premio Nacional de Literatura del Pen-Club do Brasil – poesía – 1990, Premio Luiza Cláudio de Souza); Premio Asociación Paulista de Críticos de Arte – poesía (APCA, 1990); Prêmio Olavo Bilac – poesía, da Academia Brasileña de Letras, 1991); Premio José Martí – UNESCO – Literatura (conjunto de Obra – 1994);Premio Cecília Meireles – poesía (UBE, 2008) y Premio Academia Brasileña de Letras de Poesía, 2009.

EL SECRETO SILENCIO DEL AMOR

1

Uma dor assim profunda,

dessas que doem

no fundo da noite,

como nos poetas românticos

do século 18

que deixavam a vida

em qualquer lugar.

Assim tão plena dor,

dessas que ardem

e cortam como as águas

que lavam os pés

à margem de um rio.

Tão longa dor,

dessas que doem distantes,

assim ausentes

na ampla sala de estar,

lendo os poemas

que não foram escritos

porque faltaram as palavras

que se negaram a existir.

(Faria)

1

Un dolor así, profundo,

de esos que duelen

en el fondo de la noche,

como en los poetas románticos

del siglo 18

que dejaban la vida

en cualquier lugar.

Así tan lleno de dolor,

De esos que arden

y cortan como las aguas

que lavan los pies

q la orilla de un río.

Tan extenso dolor,

de esos que duelen distantes,

así ausentes

en la amplia sala de estar,

leyendo los poemas

que no fueron escritos

porque faltaron las palabras

que se negaron a existir.

La poeta y cantante Denise Emmer

2

Tua dor é minha noite escura

então me cubro de ausências

para dormir um tempo sem relógios.

Peço-te.

Desperta-me,

tão logo a escuridão se esvaia

como soldados vencidos,

arruinados.

Encontros partidos

que jamais se cumprem

em qualquer tempo,

imprevistos rumos

do provável

desalento.

(Emmer)

2

Tu dolor es mi noche oscura.

entonces me cubro de ausencias

para dormir un tiempo sin relojes.

Te ruego.

Despiértame

tan pronto la oscuridad se desvanezca

como soldados derrotados,

arruinados.

Encuentros divididos

que jamás se cumplen

en tiempo alguno,

imprevistos rumbos

de probable

desaliento.

Álvaro Alves de Faria leyendo sus versos en el Teatro Liceo de Salamanca (Foto de Jacqueline Alencar)

3

Faço de mim

o que me resta

e de mim

não resta nada

senão aquela lágrima branca

que eu não tinha

mas sentia sempre

ao anoitecer

anoitecia em mim

uma noite como uma pedra

aquela que guardava

nos bolsos do casaco

que usava sempre que chovia

e choveu tanto

que me perdi nas poças

de uma calçada

que não existia

em meus sapatos sem rumo

a andar distâncias

que não sei

agora procuro despertar

mas meu quarto se estreitou

e meu corpo desapareceu

sem que eu percebesse

sei apenas dos finais

tantas noites

nos meus ais

(Faria)

3

Hago de mí

lo que me queda

y de mí

no queda nada

sino aquella lágrima blanca

que no tenía

pero sentía siempre

al anochecer

anochecía en mí

una noche como una piedra

aquella que guardaba

en el bolsillo de la chaqueta

que usaba siempre que llovía

y llovió tanto

que me perdí en los pozos

de un camino

que no existía

en mis zapatos sin rumbo

andando distancias

que no sé

ahora busco despertar

pero mi cuarto se estrecho

y mi cuerpo desapareció

sin que yo me diera cuenta

solamente sé de los finales

tantas noches

en mis gemidos

Denise Emmer

4

Se chegasses

com teus olhos de meia-noite

haveríamos de bater em revoada

mesmo que de ti

não reste nada

se não a lágrima branca

– minha alvorada

também de mim

não sei mais nada

a não ser

de um tempo pretérito

de cidades despertas

– hoje chagas

sim,

as noites são pedras

e eu carrego um assombro

no sapato,

meu rastro é nada

que segue

sem que eu saiba.

(Emmer)

4

Si llegaras

con tus ojos de medianoche

habríamos de aletear revoloteando

aunque de ti

no quede nada

salvo la lágrima blanca

-mi alborada

tampoco de mí

sé nada más

a no ser

de un tiempo pretérito

de ciudades despiertas

–hoy llagas

sí,

las noches son piedras

y yo cargo un asombro

en el zapato

mi rastro es nada

que sigue

sin que yo sepa.

Alves de Faria leyendo su poesía en el Teatro Liceo de Salamanca (foto de José Amador Martín)

5

Meus olhos da meia-noite

te procuram

mesmo no tempo pretérito

em que dizes viver

e que eu vivo também.

Guardo meu frasco de perfume

com o zelo de um monge

ao ler um poema em silêncio.

Quero escrever uma carta de amor

como se assim me dissesse palavras

que não sei mais.

Tenho tuas unhas vermelhas

em minha pele

e me vejo

no espelho de teu rosto,

como se não fosse eu,

que não conheço mais.

(Faria)

5

Mis ojos de la medianoche

te buscan

también en el tiempo pretérito

en el que dices vivir

y en el que yo también vivo.

Guardo mi frasco de perfume

con el celo de un monje

que en silencio lee un poema.

Quiero escribir una carta de amor

como si así me dijese palabras

que no sé más.

Tengo tus uñas rojas

en mi piel

y me veo

en el espejo de tu rostro,

como si no fuese yo

a quien ya no conozco.

6

Então, se me procuras

teus olhos são de segredo,

estou aqui

a buscar-me em palavras

de silêncio e medo

para dizer-te uma carta de amor

nunca desvelada.

E teus olhos de meia-noite

estarão além do mundo

além da solidão que agora somos

enquanto imagino-te cansado

com as tristes vestes

dos monges estrelados

O frasco de perfume,

saiba,

é verso de madrugada

que acende a alvorada

quando me vejo em ti

espelhada.

(Emmer)

6

Entonces, si me buscas

tus ojos son de secreto,

estoy aquí

buscándome en palabras

de silencio y temor

para decirte una carta de amor

nunca desvelada.

Y tus ojos de medianoche

estarán más allá del mundo,

más allá de la soledad que ahora somos

mientras te imagino cansado

con las tristes vestimentas

de los monjes estrellados.

El frasco de perfume,

sabes,

es verso de madrugada

que enciende la alborada

cuando me veo en ti

reflejada.

Pérez Alencart y Alves de Faria en el Colegio Fonseca de la Universidad de Salamanca (foto de Jacqueline Alencar)

O Secreto Silêncio Do Amor, Poema 22 | Poema de Denise Emmer com narração de Mundo Dos Poemas

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